terça-feira, 30 de novembro de 2010

HONÓRIO, O GURGEL - A FESTA

As cubanas eram superiores, mais fortes e mais chatas, mas o primeiro set foi nosso, e o Hipódromo começava a tomar ares de Bar Esperança, o chope descendo redondo, gelado, mesas lotadas, unidas no mesmo ideal, e aquele adorável tráfego típico do Baixo Gávea, pra lá e pra cá, pra lá a loura de cabelo curtinho, vestido de alcinha, tamanquinho e duas flores no tornozelo, pra cá a morena de jeans e camiseta, e nenhuma delas, a exemplo dos garçons, sem sequer resvalar o olhar na direção da nossa mesa, nem para mim, nem para meu amigo Salomão, o que não tinha a menor importância. Olhar já era suficiente, ainda mais durante um jogaço daqueles, as cubanas um pouco melhores no segundo set, e a porrada começando a cantar naquela semifinal da Olimpíada de Atlanta.

Eis que chega Bê Moreno, com seu brinco de brilhante na orelha, senta com a gente e lança a proposta, irrecusável segundo ele. Uma festa espetacular, mulher a rodo, bebida liberada, comida também, tudo numa cobertura de um prédio em Niterói, há pelo menos meia hora de carro de onde estávamos. Nesse momento, as cubanas já tinham boa vantagem no segundo set, a poucos pontos de fechar, e também por isso, mas principalmente porque Bê Moreno insistia, com seu sorriso metálico, que a festa era imperdível, que a conhecida dele, dona da festa, só tinha amiga gata etc etc etc, resolvemos deixar aquela bela atmosfera do Baixo Gávea e seguir para a travessia da Baía de Guanabara.

Bê Moreno sugeriu que fossemos todos no carro dele, novo, motor possante, mas preferimos, eu e Salomão, manter nossa autonomia de ir e, principalmente, voltar de Niterói sem depender de ninguém. Por isso fomos na frente no Honório e o Bê Moreno foi atrás, na velocidade do Gurgel, porque ele não sabia como chegar em Niterói, e como eu só sabia chegar lá pela Perimetral, o caminho foi mais longo. Saímos da Gávea, passamos pelo Jardim Botânico, adentramos pelo Humaitá e atravessamos a Voluntários da Pátria, no rumo da Praia de Botafogo, e rapidamente chegamos à Praia do flamengo e dali ao elevado da Perimetral, de onde Bê Moreno avistou as luzes amarelas da Ponte Rio-Niterói e decidiu nos passar.

Sumiu em pouco tempo, a toda velocidade, e a tarefa de achar o caminho até a festa ficou comigo e com meu vasto conhecimento da terra de Araribóia, fruto dos anos passados no velho e bom O Fluminense. Conhecia bem a área, de fato, e fazia questão de mostrar isso ao bom Salomão, enquanto saíamos da ponte e caíamos na Jansen de Mello, depois Marques de Paraná, ou vice-versa, e depois na Amaral Peixoto, para fazer o contorno e sair na Roberto Silveira, passando por aquela rua que, eu conhecia, claro, mas estava um pouco diferente, menos iluminada, mais estreita, até que, do nada, surgiu um meio-fio, e em menos de dois segundos Honório estava com suas quatro rodas em cima de uma calçada, que por sorte era bem larga.

Um pequeno contratempo, somente, incapaz de atrapalhar a chegada à Miguel de Frias, onde ficava o prédio da festa, colado na reitoria da UFF. Na portaria, a primeira decepção. O porteiro, magro, calvo, o bigodinho ralo, disse que a festa não era na cobertura. Era no play. Na tevê dele, menos de 14 polegadas, brasileiras e cubanas continuavam quase engalfinhadas em Atlanta, e o placar dos quatro sets até ali mostrava números como 33, 29 e 31.

Do elevador, o barulho da música era de festa grande, animador, mas a chegada ao playground foi esclarecedora. Numa mesa de armar, a única fora da salão de festas, quatro ou cinco pessoas permaneciam sentadas, e caladas, uma parecia a mãe, outra o avô, e as outras duas os primos adolescentes. Em volta deles, nada. Ninguém. Dentro do salão, mais duas mesas, uma com a aparelhagem de som (na verdade um daqueles três em um com caixas de som acopladas) e outra com croquete frio e demais salgadinhos sem gosto.

Com a nossa chegada, o público presente dentro do salão suplantou o da mesa do lado de fora. Éramos nós dois e mais duas meninas, uma gordinha sorridente, simpática até demais, e outra mais interessante, mas que certamente ainda não tinha completado o ginásio. Na pista de dança, a dona da festa, bonita, bem bonita, dançava animadamente com Bê Moreno, ele que, com seu sorriso metálico, seu brinco de brilhante, pegava a moça pela cintura, abraçava e beijava na boca durante a música, possivelmente alguma do George Michael.

E continuava fazendo isso quando saímos da festa, pouco menos de quarenta minutos depois da chegada. Na portaria, a tevê de menos de 14 polegadas mostrava as brasileiras chorando, com raiva, tristes, e as cubanas comemorando mais uma vitória, lógico.