segunda-feira, 14 de julho de 2014

REDENÇÃO

Terminou ontem a segunda Copa do Mundo disputada no Brasil, e depois do que se viu na última terça-feira, no Mineirão, só nos cabe homenagear os caras de 50, o goleiro principalmente. Todos eles, desde a primeira semifinal desta segunda Copa brasileira, enfim descansam em paz, cientes de que honraram a história e a força do futebol brasileiro.

A matéria abaixo não foi assinada. Saiu com um discreto Da Redação em cima, e com um mais discreto ainda Com Agência Reuters no pé, entre parênteses.

Jornal do Commercio, edição de quarta-feira, 9 de julho de 2014

Foi o maior placar já registrado numa semifinal de Copa. Feito semelhante só foi obtido, por ironia do destino, pelo Brasil de 1950, que fez 7 a 1 na Suécia no quadrangular final da Copa, isso depois de aplicar 6 a 1 na Espanha, sempre num Maracanã em delírio.


Barbosa, Augusto e Juvenal; Bauer, Danilo e Bigode; Friaça, Zizinho, Ademir, Jair e Chico. Os jogadores que estiveram em campo na derrota para o Uruguai na final da Copa do Mundo de 1950 ficaram marcados por toda a vida como protagonistas de uma tragédia sem precedentes, de uma derrota inimaginável e, muitos diziam, do maior vexame da história do futebol brasileiro. O goleiro Barbosa, então, sofreu ainda mais que os companheiros de time, isso porque deixou passar entre ele e a trave um chute à queima-roupa do atacante uruguaio Gigghia, que carregou a bola livre, sem marcação, até a quina da pequena área. O Brasil jogava pelo empate para ser campeão mundial pela primeira vez, em casa, mas com esse gol de Gigghia perdeu, e por 2 a 1, o suficiente para dar início ao pesadelo que perseguiu os jogadores de 50 até o fim da vida de todos eles, já falecidos. Pois ontem, em sua segunda Copa do Mundo jogando no País, a Seleção Brasileira, pentacampeã mundial desde 2002, mostrou o que é, de verdade, um vexame histórico. Na semifinal contra a Alemanha, no Mineirão, o time da dupla Felipão-Parreira foi goleado por inacreditáveis 7 a 1, diante de uma torcida atônita, estupefata, que antes dos 30 minutos de jogo já via o Brasil perder de 5 a 0, e jogar como um bando de crianças nervosas diante dos pragmáticos e talentosos alemães.
Foi o maior placar já registrado numa semifinal de Copa. Feito semelhante só foi obtido, por ironia do destino, pelo Brasil de 1950, que fez 7 a 1 na Suécia no quadrangular final da Copa, isso depois de aplicar 6 a 1 na Espanha, sempre num Maracanã em delírio. Ontem, no Mineirão, a festa parou na emoção de sempre do hino nacional. Com 7 minutos de jogo, Müller fez 1 a 0 completando livre na área uma cobrança de escanteio, por baixo do goleiro Julio Cesar. Logo em seguida, Klose fez o segundo pegando rebote do goleiro brasileiro, e ultrapassou Ronaldo Fenômeno para se tornar o maior artilheiro de todas as Copas, com 16 gols, um a mais que o brasileiro.
Sem Neymar, machucado, e Thiago Silva, suspenso, o técnico Luiz Felipe Scolari optou por manter o criticado Fred no ataque e entrar com Bernard e Hulk para auxiliá-lo na frente. No meio, entraram Luis Gustavo, Fernandinho e Oscar, e mais ninguém. A opção ofensiva abriu o caminho para o passeio alemão, e mesmo com dois gols sofridos em tão pouco tempo, Felipão não achou que deveria tentar corrigir seu erro. Viu do banco de reservas, tão incrédulo quanto o coordenador técnico Carlos Alberto Parreira, a Alemanha fazer o terceiro com o meia Toni Kroos, num chute que Julio Cesar quase defendeu. Ele chegou a tocar na bola, mas sem força suficiente para desviar do gol. Depois vieram o quarto gol, também de Kroos, e o quinto, do volante Khedira, e aos 29 minutos do primeiro tempo a primeira
semifinal do Mundial de 2014 já estava mais que definida.
Ao fim do primeiro tempo, os jogadores brasileiros foram muito vaiados e saíram de campo de cabeça baixa. Para a segunda etapa, Felipão fez duas alterações, colocando Paulinho e Ramires nos lugares de Fernandinho e Hulk, respectivamente. O time brasileiro até melhorou, mas desperdiçou chances claras logo depois do intervalo, com Oscar e Paulinho, com o goleiro alemão Manuel Neuer fazendo grandes defesas. A torcida alemã já gritava “Rio de Janeiro ô ô ô”, enquanto os brasileiros começaram a hostilizar Fred, que chutou muito fraco a gol aos 15 minutos e passou a ser vaiado quando pegava na bola. 
A Alemanha esperava o Brasil na defesa e ao se aventurar no ataque trocando passes fez 6 x 0 com Schuerrle, de dentro da área aos 24 minutos. O mesmo atacante ampliou dez minutos depois, num chute alto de esquerda. Para poupar Fred, o treinador brasileiro o substituiu por Willian aos 24 minutos, mas o atacante do Fluminense não escapou das vaias ao sair. Nos minutos finais, a Alemanha tocou bola ao som de "olé" das arquibancadas lotadas do Mineirão. Aos 45 minutos, Oscar ainda diminuiu para o Brasil, fazendo a torcida vibrar um pouco, ainda que meio sem graça.
Ao contrário do silêncio sepulcral no Maracanã no fim da decisão da Copa de 50, o que se ouviu ontem com o apito final foram vaias, muitas vaias. Com alguns jogadores chorando, especialmente Oscar, Felipão reuniu todos no meio-campo e eles aplaudiram a torcida. Abraçados, David Luiz e Thiago Silva foram os últimos a deixar o campo. Com o time bagunçado, o Brasil encerrou de forma constrangedora a chance de disputar o título no Maracanã e vai jogar pelo terceiro lugar em Brasília, no sábado, depois de chegar ao torneio como favorito devido ao título da Copa das Confederações de 2013, e por jogar em casa. 
Mas a Seleção, que jogava para fazer história como a primeira a chegar à final nas duas Copas que disputou em seus domínios, não conseguiu repetir o feito de 50. Ao contrário daquela equipe, que fez de Ademir artilheiro do torneio e o brasileiro que mais gols (nove) marcou numa só Copa - além de ter feito o primeiro do Mundial, contra o México, no Maracanã -, o Brasil de 2014 teve uma campanha fraca no Mundial em casa, com desempenhos que não convenceram mesmo quando seu astro, Neymar, estava em campo. Sem ele, virou vexame.

terça-feira, 8 de julho de 2014

TRISTEZA NA COPA

Ele gostava de jogar bola desde muito antes de ficar famoso. Peladeiro de coração, como muitos que conhecemos, continuou a ser depois da fama. Pintando a oportunidade e o momento sendo adequado, lá estava ele jogando futebol, se divertindo, mesmo sendo o gordo da turma, o que só aumentava a popularidade. Na Copa do Mundo de 2006, trabalhava na Alemanha, acompanhando de perto a seleção, e em dado momento a oportunidade apareceu. Uma pelada nas proximidades da concentração brasileira, campo de grama, perfeita, no friozinho gostoso do verão alemão, em meio a um clima que, durante o Mundial, agora sabemos, só o país sede pode proporcionar. Deve ter se divertido muito, e deve ter se excedido um pouco também na empolgação do momento, porque de noite passou mal, e na manhã seguinte sofreu o infarto fulminante, fatal, aos quarenta e três anos, depois de fazer o que gostava desde criança, no lugar ideal para isso, num momento mágico, em meio àquela que, por isso mesmo, pode ser considerada a mais triste das Copas.

A entrevista abaixo foi feita uns dois anos e meio antes da morte do entrevistado, na Alemanha, durante a Copa de 2006, em que o Brasil foi eliminado antes, nas quartas, mas de uma maneira bem mais aceitável que a de hoje, nas semis.

Revista Istoé Gente, edição 225, de 24 de novembro de 2003

"Jogo pelada toda sexta. Já fui lateral, centroavante, e hoje pareço mais a bola. Mas se os caras correrem por mim, posso jogar tranqüilamente. Vão achar que sou o Romário. Minha movimentação é igual".

Irmão do economista Sérgio e do médico pediatra Marcos, Cláudio Besserman Vianna, 41 anos, tinha tudo para ser a ovelha negra da família. Chegou a provocar uma reunião convocada pelos pais para se discutir seu futuro, até que o humor o salvou. Como Bussunda, virou um dos mais populares entre os sete integrantes do Casseta & Planeta. Além do programa semanal na Globo – que atualmente se reveza com A Grande Família no posto de humorístico de maior audiência da emissora –, poderá ser visto nas telas de cinema a partir desta quarta-feira 19, no primeiro filme dos cassetas, A Taça do Mundo É Nossa.

Por que situar a história na década de 70?
O humor da época era contra a ditadura, e hoje em dia só se lembram do período para falar sério, porque ainda é esse tabu. A ditadura é a guerra mundial do brasileiro, uma coisa que marcou. E é uma época que dá muita piada. Tem comunistas, militares, sexo, drogas e rock’n’roll, jovem guarda, seleção tricampeã. Quando chegamos nessa época a história veio surgindo, foi tranqüilo.

A década de 70 também marcou o começo de vocês.
É verdade. A Casseta Popular (jornal alternativo que, junto com o Planeta Diário, de Hubert, Reinaldo e Cláudio Paiva, deu origem ao Casseta & Planeta) começou em 1977. Até hoje, Beto Silva, Marcelo Madureira e Hélio de la Peña usam os nomes que escolheram na época, porque o jornal era clandestino e não podíamos dar os nomes verdadeiros. Como já era Bussunda, eu assinei como Bussunda Dois. Se viessem me prender, diria que eu era o Bussunda Um. A Casseta éramos nós quatro e o Cláudio Manoel, que era Claude Mañel na época, mas abdicou desse nome gay.

É verdade que na faculdade você era uma preocupação para a família?
Fiz até uma palestra uma vez com o título “Como o Humorismo Salvou Minha Vida”. Meus pais chegaram a reunir meus irmãos sem mim para falar: “Tem que cuidar do Claúdio. Se a gente morrer, quem vai cuidar dele?”. Realmente, eu era um problema. No segundo grau cheguei a ser reprovado com zero em todas as matérias, porque eu matava a aula e ninguém em casa sabia. Depois cheguei na faculdade pública (escola de comunicação da Universidade Federal do Rio de Janeiro).

Como passou no vestibular matando aulas?
Tinha uma boa base. Na verdade, meu projeto de vida nessa época era não fazer nada. Estudei um pouco pra passar no vestibular e pronto. Fui o penúltimo colocado para o segundo semestre. Na faculdade pública, meus pais não podiam reclamar que pagavam mensalidade, e a faculdade ajudava nesse projeto de não fazer nada. Então fiquei lá. Não me formei, mas foram ótimos anos.

Como entrou na Casseta?
A Casseta surgiu na Engenharia da UFRJ, quando o Beto, o Hélio e o Marcelo fizeram um jornal para reclamar da falta de mulher na faculdade. Era amigo deles da praia, em Ipanema, e o Cláudio também. Quando resolveram ampliar o jornal, nos chamaram. Entrei na faculdade lançando o primeiro número de que participei. A gente fazia o jornal e vendia até ter grana para rodar outro. Isso durava quatro, cinco meses. Fiquei assim na faculdade, até que, quando estava tentando me formar, juntando um monte de matéria, pintou o convite da Globo para escrever o TV Pirata (em 1988). Aí abandonei a faculdade.

Você vê muita televisão para criar as paródias do programa?
Já fui noveleiro. Hoje, vejo a novela das oito às terças-feiras, na espera do programa. Não acompanho muito, e acho que esse é o nosso mérito. Fazemos a paródia para o cara que vê a novela de vez em quando. A gente chama o personagem da Malu Mader de Malu Mader, isso é o que dá certo. Vejo mais tevê a cabo, mas também vejo tevê aberta. Adoro os programas bons e os ruins. Só não gosto dos médios. Tem uns programas muito ruins que são involuntariamente engraçados. Não vou ficar nomeando, mas tem vários aí, todo mundo sabe. Os programas de auditório em geral, as novelas mexicanas. Gosto de ver.

Sempre vê televisão com olhar de humorista?
Depende. Quando o noticiário é pesado, vejo de baixo astral como todo mundo. Talvez fique até mais baixo astral por saber que não vai dar para fazer piada com aquilo. Mas normalmente tenho esse olhar, sim. Quinta-feira, por exemplo, é o dia que escrevemos piada. Então na quarta vejo o Jornal Nacional pensando o que dá piada ali. Mas também não sou maluco de ver televisão o tempo inteiro pensando no que vou botar no programa. As coisas aparecem.

Como surgem as piadas?
A gente fica na redação com a tevê ligada na Globonews, sem som. No último programa (ele se refere à terça-feira 4), teve uma piada com o Lula na África. Tinha aparecido na tevê ele falando com um cara, que estava com uma negra bonita do lado. Aí o Marcelo Madureira falou: “Olha lá, ele quer trocar a Bené dele pela do africano”. A gente botou no programa. Muita piada surge porque você tá vendo o Lula falando, sem som, e começa a dublar.

Como intérprete do presidente Lula, o que espera dele?
Gostaria muito que ele raspasse a barba, porque é insuportável colar aquela barba toda semana. Como cidadão, ainda estou como todo mundo. Vendo esse governo na espera. Tem coisas boas e coisas ruins, mas ainda não dá para julgar. E como humorista não tenho do que reclamar. Está ficando cada vez melhor. Os ministros estão colaborando.

Os políticos brasileiros ajudam os humoristas?
Uma das gravações mais legais que fiz foi na época do impeachment do Collor. Eu e o Beto fomos para Brasília de vestido tomara-que-caia. Entrevistávamos os deputados até que o Roberto Freire disse que estava acontecendo uma reunião dos líderes do movimento Fora Collor na casa do Orestes Quércia, e nos deu o endereço. Chegamos e fomos entrando. Quando vi, estavam sentados na sala o Ulysses Guimarães, o Lula, o Quércia e eu, de tomara-que-caia. Ficamos aquela meia hora antes da reunião, para a imprensa fazer as imagens, depois mandaram a gente sair.

Já desistiu de alguma piada por se tratar de um assunto forte?
Várias vezes. O que provoca comoção é muito complicado. O atentado de 11 de setembro, por exemplo, era um assunto único. Só se falava disso e a gente não podia fazer piada, porque tinha morrido muita gente. Depois de umas duas semanas, decidimos apontar para o Osama Bin Laden, para tirar a piada de Nova York, e conseguimos fazer. Mas é difícil. Fatos como a morte do Senna, a dos Mamonas Assassinas, por mais que as pessoas contem piadinhas, nunca tornamos público. Em alguns casos, você não pode usar um canhão como a TV Globo, por respeito às pessoas que estão sofrendo.

Existe algum critério para definir o que pode virar piada?
É uma questão de respeito. Tem gente que você respeita e tem gente que você, e o povo brasileiro, não respeita. Na época do impeachment do Collor, fizemos um programa todo sacaneando ele, que não pôde ir ao ar. Passado um mês, o cara continuava presidente, mas a situação tinha mudado tanto que ninguém mais o respeitava. Então o programa foi ao ar um mês depois.

Vocês sofrem censura na Globo?
Esse foi um veto do departamento jurídico. Não encaro como censura. Os caras estão vendo qual o processo que eles podem levar. De vez em quando a gente chama de ladrão o cara que ainda não foi condenado, isso acontece. Agora, censura política não me lembro de ter sofrido. Tanto temos a compreensão de até onde podemos ir, como eles têm a compreensão de que a gente é humor.

Já sofreu reclamações?
É raro alguém querer pagar esse mico, mas acontece. Fomos processados por um puxa-saco do Collor, de quem não me lembro o nome. O Benedito Ruy Barbosa não gosta de piada com novela dele. Mas os atores pedem para fazer piada com seus personagens. A maioria das pessoas gosta. Deve ter quem não goste, mas nunca levei porrada na rua.

Esperava todo esse sucesso?
Esperava o salário no fim do mês e estava bom demais, mas a gente trabalhou para isso. Temos a vantagem de adorar televisão. Gosto do público da tevê, enorme, e a gente buscou a popularidade sempre.

Mudou sua rotina por causa da fama?
Tenho essa coisa contraditória. Adoro meu trabalho, mas detesto ser o centro das atenções. Por isso, e também porque adoro ficar em casa com a minha família (Bussunda é casado com a jornalista Angélica Nascimento e pai de Júlia, 10) saio pouco à noite. Não gosto de ir num bar e todo mundo ficar olhando para mim.

Ainda acompanha futebol?
Parei com a coluna que escrevia no Lance (diário esportivo) no início do ano, para ter mais tempo para o filme. Cansei um pouco, até pela fase ruim do futebol carioca. Só volto a escrever agora no dia em que o Eurico Miranda sair do Vasco, mas continuo acompanhando. Vejo qualquer jogo.

Qual a expectativa para o jogo com o Ronaldo (Bussunda vai à Suíça, gravar a participação do Tabajara F.C. num amistoso entre os amigos de Ronaldo e os de Zidane)?
Se derem mole, vamos entrar pra jogar. Jogo pelada toda sexta. Já fui lateral, centroavante, e hoje pareço mais a bola. Mas se os caras correrem por mim, posso jogar tranqüilamente. Vão achar que sou o Romário. Minha movimentação é igual.