Revista Istoé Gente, edição 181, de 20 de janeiro de 2003
“Me baseio na minha vida para criar porque é a única coisa que eu realmente sei”.
Desde que
homenageou a ex-namorada Leila Diniz dirigindo Todas as Mulheres do
Mundo, em 1967, o cineasta Domingos Oliveira nunca precisou se afastar muito
de casa para realizar sua obra. Basta prestar atenção na sala do apartamento que
o diretor de 66 anos divide com sua mulher, a atriz Priscila Rosembaum, no
Leblon, para comprovar isso. Do sofá ao quadro na parede,
passando pelo teclado disfarçado de piano, tudo aparece em
Separações, último filme de Domingos, que teve várias cenas rodadas no
apartamento e rendeu à Priscila o Kikito de melhor atriz no Festival de Gramado
de 2002. “Me baseio na minha vida para criar porque é a única coisa que eu
realmente sei”, explica o cineasta.
Nadando contra a
corrente dos filmes de temática social, como Cidade de Deus,
Separações levou 17 mil pessoas ao cinema nos seis primeiros dias de
exibição (foi lançado na segunda-feira 3). O filme, que conta a história do
relacionamento de um típico casal de artistas da zona sul carioca, vivido por
Domingos e Priscila, tem tudo para se tornar hit de verão e repetir o sucesso do
primeiro longa do cineasta, feito numa tentativa de reatar o namoro com Leila
Diniz, protagonista de Todas as Mulheres do Mundo. “Tinha me separado da
Leila e queria voltar de qualquer jeito. Aí fiz o filme pra ela”, conta o
diretor, que não reconquistou a atriz mas resolveu a relação. “A dor da
separação foi redimida através do filme.” Mas nem tudo foi fácil. Apesar de
dizer que não se lembra de detalhes da época, Domingos assume que “segundo
diziam os colegas de set”, ele acabava de dirigir uma cena e saía para
chorar, pelo menos no início das filmagens.Juntos há 21 anos, Domingos e Priscila nunca se separaram, ao contrário dos personagens do filme. Mas, no quinto casamento, o diretor se considera experiente no assunto. “Me separei várias vezes”, afirma o cineasta, que já tem outros dois projetos na manga: um policial noir, chamado O Brilho da Gota de Sangue, e A Primeira Valsa, uma história autobiográfica sobre sua passagem de adolescente a adulto. Como Separações, os dois roteiros foram adaptados de peças de Domingos para o teatro.
Nada mal para quem, até lançar Amores, em 1998, estava há 21 anos sem filmar, talvez pela própria falta de vocação do diretor para captar recursos. “Fico nervoso, achando que os ricos pensam que eu quero tirar o dinheiro deles, o que é exatamente o que eu quero”. Sem fazer cinema, o autor voltou-se para o teatro e a televisão, e tornou-se dono de uma obra numerosa. “Meu nome está diretamente vinculado como autor, ator ou diretor, a 140 títulos”, contabiliza.
Pai da atriz Maria Mariana, 30, e avô de Clara, 3, e Laura, 1, Domingos ainda espera a oportunidade de levar para o cinema a peça Confissões de Adolescente. Autora do texto, Mariana diz que não tinha alternativa a não ser seguir a vocação do pai. “A paixão dele pela arte é tão grande que tinha de fazer teatro pra me aproximar”, lembra a atriz, que hoje se dedica a cuidar das filhas. Enquanto a peça não vira filme, o cineasta só quer continuar a retratar seu cotidiano, tentando mostrar a vida como ela é, sem se preocupar com prêmios como o Oscar, por exemplo. “Jamais ganharei o Oscar. Não é uma festa para a qual fui convidado”, conclui.