
A matéria abaixo foi no momento da virada, quando ele virou prefeito e não parou mais de ganhar eleição, até ontem. A foto aí de cima é do Leandro Pimentel.
Revista Istoé Gente, edição 280, de 20 de dezembro de 2004
“Fui falando, mas o senador ficava sorrindo e dizendo ‘muito bem, muito bem’”.
A poesia O Jovem e a Paz Caminham Juntos, escrita por Lindberg Farias aos 14 anos, era inspirada nas primeiras leituras do adolescente. Um dos versos mencionava “pombas brancas sobre o Kremlin e a Casa Branca” e o último afirmava que se Karl Marx fosse vivo diria: “Jovens de todo mundo, uni-vos”. “É das coisas mais ridículas da minha vida”, reconhece, entre risos, o prefeito eleito de Nova Iguaçu, na Baixada Fluminense. Aos 34 anos, o deputado federal do PT se aliou a partidos como o PFL e o PP para vencer Mário Marques, do PMDB de Anthony Garotinho, com 57,74% dos votos
no segundo turno. Seu futuro político pode ser medido pelas palavras do aliado César Maia. “Se passar pelo teste nessa prefeitura, Lindberg tem tudo para ser uma forte liderança estadual e até nacional”, diz o prefeito carioca.
Na sala do apartamento para onde se mudou há um ano e meio, com o intuito de disputar a eleição, o ex-presidente da União Nacional dos Estudantes (UNE) não exibe biografias da revolucionária Rosa Luxemburgo ou de Che Guevara. Os textos da adolescência foram substituídos por um relato da trajetória de Manoel Ferreira (PP), pastor da Assembléia de Deus, e obras de Eça de Queiroz e Marcel Proust. O socialismo sobrevive de maneira mais suave, num livro do fotógrafo cubano Alberto Korda. “O cara que queria a insurreição deu lugar a alguém que sabe que tem que dar um passo de cada vez”, explica o prefeito eleito.

Vieram, então, as primeiras gafes do líder estudantil ainda verde na política. Ao se reunir com o então presidente do Congresso, Mauro Benevides, em Brasília, Lindberg não sabia do costume da foto protocolar, tirada antes de encontros solenes. Na frente de dezenas de fotógrafos, o presidente da UNE apertou a mão do senador e, enquanto piscavam os flashes, tentou, sem sucesso, iniciar a conversa. “Fui falando, mas o senador ficava sorrindo e dizendo ‘muito bem, muito bem’”, lembra Lindberg.
O desconforto com as práticas políticas continuou durante o primeiro mandato como deputado federal, pelo PC do B, entre 1995 e 1998. O defensor do povo nas ruas como única solução chamava o Congresso de casa das elites e não perdia uma manifestação contra as privatizações do governo Fernando Henrique Cardoso. Na venda da Vale do Rio Doce, entrincheirou-se com 100 estudantes na Bolsa de Valores do Rio. No leilão das Teles, jogou pedra na polícia. Achava o máximo. “Me sentia o próprio Guevara”, afirma.

O casal se separou em 1999, mas se reconciliou em fevereiro deste ano. Maria Antônia levou Luiz para Belo Horizonte, mas Lindberg via o filho único todo fim de semana. Ou ia para Minas, ou Luiz viajava para o Rio. “O Lindberg não pára de beijar e abraçar o Luiz. Eu é que dou bronca, ele fica com a parte boa”, entrega Maria Antônia.
Derrotado na eleição de 1998, Lindberg ganhou tempo para recuperar a forma e os estudos. Pegava ônibus para o curso de Direito na PUC carioca (ele está a um ano de se formar), corria na Praia de Copacabana, fazia musculação e nadava. Em um ano, voltou aos atuais 87 kg e retomou a aparência que lhe rendeu o apelido de Lindinho e o assédio de boa parte do eleitorado feminino.
A maneira de ver a política também mudou. Filiado ao PSTU, dissidência do PT de extrema esquerda, Lindberg não aceitou coligações em 1998. Foi o sexto entre os candidatos do Rio para a Câmara Federal, com 73 mil votos, mas perdeu a vaga porque sua legenda não conseguiu o mínimo necessário de eleitores. Aproveitou a ocasião para reforçar o discurso radical. “Dizia: de que serve o Parlamento? O que vale é a luta nas ruas”, lembra.

Ameaçado de morte algumas vezes na Baixada, tem andado com seguranças, o que não tira sua animação com futuros projetos. Quer explorar áreas verdes como o parque municipal, onde se exercita. Também pensa numa empresa de saneamento em parceria com a iniciativa privada, para se ver livre da Cedae (Companhia Estadual de Água e Esgotos), que, no passado, defendeu contra os planos de privatização do ex-governador Marcello Alencar (1995-1998).
Aliado de Lindberg na última campanha, Marcello ouviu dele um mea culpa. “Ele me confessou que hoje pensa como eu. Ele está mudado. É talentoso e carismático pra burro”, diz o ex-governador. As mudanças, segundo o prefeito eleito, não são tão gritantes. Se houvesse a chance de uma revolução no Brasil, ele garante, largava tudo e entrava. “Mas essa bandeira não é real. Dizem que de revolucionário passei a reformista. É isso mesmo. É com reformas que conseguiremos avançar".