quinta-feira, 20 de março de 2008

PARAÍSO



Eu e o Grego costumávamos voltar da rua mais ou menos na mesma hora. Pegávamos às oito e saíamos, salvo raras tragédias, às quinze. Ao meio-dia, já estávamos na redação com a apuração do dia, cada um na frente de sua Remington, ou Olivetti, às vezes na companhia do Maçom, cujo horário coincidia com o nosso.

Nesse dia, feriado de Corpus Christi, o relógio apontava treze e tantas e nada do Grego. O cara tinha ido a São Gonçalo, cobrir o tradicional costume da população local de, nessa data festiva, enfeitar as ruas da cidade com gigantescos tapetes de serragem. Mas tinha também a incumbência de abordar o prefeito sobre outro assunto, e para isso foi obrigado a se embrenhar na multidão diante do palanque das autoridades, naquele que foi o maior evento da cidade pelas comemorações do dia do corpo de Jesus Cristo. Além de tudo fazia calor. Muito calor.

Lá pelas catorze horas, depois de passar quase duzentos minutos espremido entre fiéis gonçalenses, debaixo de um sol escaldante, adentra o Grego na redação. Apesar do traje padrão – calça jeans e camisa social de mangas curtas, pra fora da calça –, o cara parecia que voltava de um trio elétrico baiano, daqueles que os bombeiros ficam jogando jatos de mangueira em cima.

A camisa, bem mais escura do que o azul original, estava colada ao corpo, e o suor também grudara um pedaço de franja na lateral da testa. Com a fisionomia de quem acabara de escapar de um naufrágio, veio até a minha mesa e pediu, implorou, para fazer uma pergunta. Eu aquiesci e ele, num questionamento sucinto e com uma ligeira pitada de revolta, expôs a dúvida dilacerante que o assaltava desde o primeiro tapete de serragem.

Como alguém que mora em São Gonçalo pode acreditar em Deus?

Na época ri e até concordei com o cara, mas hoje discordo veementemente dele. Do alto de minha experiência na segunda cidade mais populosa do estado entre os anos de 1992 e 1996, quando por lá circulei toda semana, em busca de boletins de ocorrências, valões, corpos no meio do mato e outros assuntos palpitantes, digo que nenhum lugar é mais propício à crença no divino do que São Gonçalo.

Posso até estar sendo injusto, porque, como disse, freqüentei São Gonçalo entre 1992 e 1996, com outras duas ou três incursões até 2001. Não sei se a cidade mudou muito. Acredito que não. Suas ruas de terra batida, com esgoto a céu aberto nas duas margens, suas favelas, com barracos menores até que uma mesa de jantar, e suas praias fedorentas no fundo da Baía, formadas basicamente de lodo, lixo e merda (como mostra a imagem dessa fotógrafa), são cenários que só podem remeter à existência de um paraíso fora da Terra, de um éden onde tudo é bonito, agradável, e nada é feio ou malcheiroso. E digo isso sem ter conhecido os dois piores bairros de lá, na opinião de sujeito nascido e criado na área.

Foi num papo com o grande Alvarenga, fotógrafo de qualidade ímpar, que eu descobri a existência das duas localidades. Estávamos no carro de reportagem, percorrendo alguma rua esburacada, e eu, com toda a sinceridade do meu coração, resolvi dizer que aquele bairro (não lembro qual) era dos piores que eu já tinha visto no castigado município à beira da BR-101, ao que o nobre retratista, gonçalense convicto, retrucou de imediato:

Isso é porque você não conhece o Calaboca. Nem o Meia-Noite.

Me calei, e tentei evitar ao máximo imaginar como poderia ser um lugar chamado Calaboca, ou outro com a alcunha de Meia-Noite. Se bem que há nomes bonitos também em São Gonçalo. Temos lá o Lindo Parque, o Rio do Ouro e até um Paraíso, mas este, infelizmente, não é tão idílico.

O texto abaixo é típico de início de carreira. Você está no carro de reportagem, se depara com uma situação estranha, até para São Gonçalo, e resolve levar mais uma matéria para a redação. É também uma homenagem a essa brava gente gonçalense, antes de tudo forte. Porque São Gonçalo pode ser uma cidade feia, com o perdão da sinceridade, mas seus moradores são o que há de melhor ali, povo sofrido, batalhador, que enfrenta as infinitas dificuldades da vida com bom humor e resignação. E se isso tá parecendo uma tentativa descarada de aliviar minha barra com algum habitante do nobre município que possa, por acaso, aparecer por aqui, só pode ser mera coincidência.

Jornal O Fluminense, edição de quarta-feira, 5 de outubro de 1994



“Quero fazer um avião movido a pedal para voar sobre São Gonçalo. Como eu vou fazer isso não posso contar, mas disposição é o que não falta. Afinal de contas, se o avião cair não vai passar do chão”

Não são só os cavalos e charretes que disputam o espaço das ruas de São Gonçalo com os carros. Há mais de 20 anos, o funcionário público aposentado Gérson Carvalho Belmonte, de 59 anos, circula pela cidade com seu velho e possante “Chevrolet 27”- na verdade um minicaminhão movido a pedal e feito de madeira e lata. O exótico veículo já é bastante conhecido no município e Gérson garante que o carro ainda é útil para transportá-lo aonde for necessário, até a Icaraí, em Niterói, por exemplo.
Gérson mora no Mutondo, na Rua Manoel Martins, e costuma utilizar seu carro para o transporte de carga. O minicaminhão tem capacidade para carregar até três sacos de cimento, já que suas rodas finas, iguais às das bicicletas, não permitem mais que isso. Segundo o aposentado, o veículo tem duas trações de correntes (atrás e na frente), o que o torna mais leve e fácil de dirigir. Mas não é por causa dessa facilidade que Gérson afirma que, no que depender dele, seu “Chevrolet 27” ainda vai rodar por um bom tempo. “Estou com 59 anos mas tenho agilidade para levar esse carro aonde eu quiser”, garante.
O minicaminhão foi construído na própria casa de Gérson, que utilizou madeira e folhas de aço (usadas para fabricar outdoors) na sua fabricação. Na época, o aposentado, que também se diz inventor, fez o carro para usá-lo na campanha de um candidato a prefeito, mas parece que ele condena esse passado. “Quando estive em Niterói, alguns políticos quiseram se aproveitar do meu carrinho colocando cartazes e outras propagandas, mas eu não deixei”, conta.
Apesar do sucesso e da eficácia comprovada do “Chevrolet 27”, Gérson não quer parar por aí. Ele tem um projeto no mínimo pretensioso. “Quero fazer um avião movido a pedal para voar sobre São Gonçalo. Como eu vou fazer isso não posso contar, mas disposição é o que não falta. Afinal de contas, se o avião cair não vai passar do chão”, diz o aposentado, com o tom suicida característico a todo inventor que se preza. Ao que parece, São Gonçalo tem o seu Santos Dumont e não sabe.

quarta-feira, 5 de março de 2008

NIEMEYER NA DIREITA

A matéria era a segunda de uma nova série da revista, que tinha por objetivo resumir a biografia de celebridades de peso em até quatro capítulos, um em cada edição. A recomendação era para conseguir fatos novos, inusitados, da vida dessas pessoas. A mim coube a tarefa de tentar descobrir curiosidades ainda desconhecidas na trajetória desse cidadão aí do lado (na foto do Leandro Pimentel), que na época, aos 95 anos, já tinha sido tema de centenas de reportagens e dezenas de livros.

Era a minha segunda entrevista com ele. Na primeira, uns dois anos antes, tudo correra bem, apesar de um momento tenso, quando resolvi citar uma frase anterior dele, a respeito da importância das mulheres, para tentar conseguir as tais declarações diferentes.

Virei para o renomado arquiteto e lembrei que uma vez, sei lá quando, ele dissera que nada no mundo era mais importante que a mulher, ou algo parecido. Pensei, na minha ingenuidade, que o cara pudesse sair filosofando sobre a mulher e que dali poderia sair algo bom, talvez até um título, mas ele apenas ficou olhando para a minha cara, com a mão na boca, e soltou uma pergunta rápida, seca.

E não é?

Sorri amarelo, concordando, e mudei rapidamente de assunto. Devo ter falado do Fidel Castro (ou do Brizola) e a entrevista seguiu até o fim. Na segunda vez, calejado, não cometi quase nenhuma bobagem, que eu me lembre. Consegui até ouvir de Niemeyer que ele, aos 17 anos, atuou num Fla-Flu com a camisa do Fluminense. Jogou de meia-direita, com a 8 (se na época existissem os números nas camisas), e brincou com a posição, dizendo que deveria ter jogado na esquerda.

Era uma história aparentemente inédita. Pelo menos não tinha visto referência àquilo em lugar algum da pesquisa que fizera antes da entrevista. Depois recorri a um amigo tricolor, meio enciclopédia de futebol, e ele também não sabia nada disso.

No mais, a matéria não teve muitas outras novidades, como era de se esperar. Mas Niemeyer, além de toda a reverência necessária pela carreira, as obras, Brasília, o prestígio internacional etc etc etc, deu a impressão de ser um sujeito boa praça. Elogia o Stálin de vez em quando, mas parece ser um cara legal e ainda contou outra história interessante, essa talvez já conhecida na época.

Foi quando Fidel o visitou na cobertura da Avenida Atlântica, em Copacabana. Por uma dessas extravagâncias da arquitetura, só um dos dois elevadores do prédio dava acesso ao estúdio de Niemeyer, Lá pela meia-noite, quando El comandante resolveu ir embora, o elevador estava parado, desligado. O jeito foi tocar a campainha da cozinha do vizinho, para atravessar o apartamento dele até o outro elevador.

Agora fico imaginando o vizinho, à meia-noite, pijamão, em frente à tevê, pronto pra dormir, quando toca a campainha da cozinha. O cara vai atender achando que é engano ou tragédia e se depara com Fidel Castro, pedindo gentilmente para atravessar o apartamento dele até o outro elevador. Como dizem, Copacabana tem de tudo mesmo.


A matéria abaixo é o primeiro capítulo dos quatro sobre o Niemeyer. Não tem a história do Fidel, que ficou no quarto capítulo, mas também ela acabou de ser contada.

Revista Istoé Gente, edição 216, de 22 de setembro de 2003



Aos 95 anos, o arquiteto guarda na memória o placar daquele Fla-Flu da sua juventude (1 a 1) e a convicção de que, apesar de não ter feito gol, não decepcionou os colegas de time. “Era razoável”, afirma Niemeyer.

A rua Passos Manuel, em Laranjeiras, na zona sul carioca, era íngreme, mas o menino que nela nascera, em 1907, na casa do avô materno, situada no número 26, não se importava. Durante toda a infância e boa parte da adolescência, subia e descia correndo a ladeira de paralelepípedos em animadas partidas de futebol com amigos do bairro. A paixão pelo esporte chegava a livrar o aluno do Colégio dos Barnabistas Santo Antônio Maria Zaccaria da punição tradicional por se comportar mal na classe. Em vez de escrever 500 vezes no quadro negro “não devo falar na aula”, seu castigo era outro. “O professor me proibia de jogar futebol. Era mais eficiente”, lembra o antigo aspirante a craque, que teve seu momento maior no esporte numa tarde de 1925, aos 17 anos.
Convidado por amigos do bairro, envergou a camisa tricolor do Fluminense e, no time juvenil, jogou a preliminar de um Fla-Flu pelo campeonato carioca no estádio das Laranjeiras, próximo à sua casa e então considerado o mais importante do País. Seguir a carreira de jogador, no entanto, jamais passou pela cabeça do rapaz que chegou a recusar um convite do então goleiro titular do Flamengo, Amado Benigno, para ingressar na equipe rubro-negra. Eram tempos de amadorismo no futebol, quando quase todos os atletas eram filhos de famílias abastadas e atuavam por amor aos clubes, sem ganhar um tostão sequer. Seguindo o costume da época, Oscar Niemeyer manteve o futebol como diversão ocasional e optou pela arquitetura, a atividade que o tornaria famoso em todo o mundo.
Aos 95 anos, o arquiteto guarda na memória o placar daquele Fla-Flu da sua juventude (1 a 1) e a convicção de que, apesar de não ter feito gol, não decepcionou os colegas de time. “Era razoável”, afirma Niemeyer, que brinca com a posição em que atuava. “Devia estar na esquerda, mas era meia-direita”, diz, em alusão à conhecida adesão ao comunismo que até hoje faz questão de manter intacta.
Das influências adquiridas na infância, a mais forte foi a do avô materno, Antônio Augusto Ribeiro de Almeida, que hoje batiza a antiga rua Passos Manuel. Ministro do Supremo Tribunal Federal, Ribeiro de Almeida tinha prestígio e condições financeiras suficientes para dar uma vida confortável às doze pessoas da família que viviam sob seu teto. A característica mais admirada pelo neto Oscar, no entanto, era o desapego ao dinheiro, que fez com que a residência de Laranjeiras estivesse hipotecada na época de sua morte, em 1919, quando Niemeyer tinha 12 anos. “Ele morreu pobre. Não era uma pessoa ligada a dinheiro, o que me fez guardar uma boa lembrança dele”, conta o arquiteto, que morou na antiga rua Passos Manuel até dez anos após a morte do avô e sempre fez constar, no fim de seus livros, o nome Oscar Ribeiro de Almeida de Niemeyer Soares embaixo da assinatura pela qual é conhecido internacionalmente. Na certa numa tentativa de preservar as origens portuguesa (Ribeiro e Soares), alemã (Niemeyer) e a mais distante, árabe (Almeida).
A rotina na casa de Laranjeiras era típica de uma família burguesa da época. No sobrado de dois andares, Niemeyer vivia sob as asas dos avós, Ribeiro de Almeida e Mariquinhas, e morando com os pais, Delfina e Oscar de Niemeyer Soares, no andar de cima. Ele e os cinco irmãos (Lília, Carlos Augusto, Leonor, Judite e Paulo) conviviam ainda com os tios Nhonhô e Ziza e a prima Milota. Já na adolescência, Niemeyer mostrava o pouco interesse por assuntos religiosos, que o faria tornar-se ateu convicto, e não ligava muito para as missas celebradas aos domingos na espaçosa sala da casa, organizadas pela religiosa Ziza e onde ressoavam as salve-rainhas rezadas pela avó.
Um pouco mais tarde veio a época em que o jovem Oscar não dispensava as diversões da vida noturna no Rio antigo. Se a influência maior vinha do avô, era o tio Nhonhô, na época diretor do Fluminense Futebol Clube, que o levava a locais como o extinto bar Americano, no centro da cidade, o bar Lamas – até hoje tradicional reduto da boêmia, na zona sul carioca – e a Lapa. O bairro do centro da cidade, com seus cabarés, também era ponto de encontro dos amigos do então estudante do ensino médio, acostumados a passar por lá para tomar uma bebida nos bares. “Ficamos familiares, tanto que íamos durante o dia também, para jogar carta com as moças”, lembra Niemeyer.
Mantido até hoje num canto do escritório do arquiteto, em Copacabana, o cavaquinho é testemunha dos tempos de boêmia. Era nele que Niemeyer tocava os sambas da época, na companhia de um grupo de amigos que se reunia no Clube de Regatas Guanabara, na Praia de Botafogo, e permanece em sua memória. “Éramos eu, Gastão Vida de Cão, Siri e o Barqueiro”, lembra ele, como se estivesse recitando a escalação de uma seleção de futebol e garantindo não ter sido brindado com qualquer apelido na época.
A vida despreocupada durou até o casamento, aos 21 anos, com Annita Baldo, filha de imigrantes italianos de Pádua, perto de Veneza. Sem pompa, nem circunstância, a cerimônia do matrimônio atendeu aos desejos da religiosa noiva, que conseguiu convencer o noivo ateu a casar numa igreja do bairro. “Casei por formalidade. Mais católica do que minha esposa é impossível, então não me incomodei em casar dessa forma”. O casamento foi no mesmo ano da formatura no ensino médio, que marcou o início da vida profissional do futuro arquiteto. Casado, o estudante assumiu a responsabilidade que passou a ter e trocou a boêmia pelo trabalho na tipografia do pai.
Um ano depois, em 1929, ainda ajudava o pai na tipografia quando matriculou-se na Escola Nacional de Belas Artes do Rio de Janeiro, onde se formaria como engenheiro arquiteto, em 1934. A partir do terceiro ano do curso, o jovem estudante passou a ter duas opções para seguir em frente na carreira escolhida: ganhar um salário qualquer como estagiário de firmas construtoras, como a maioria de seus colegas, ou trabalhar de graça e aprender “o lado bom da arquitetura”, como ele mesmo diz, no escritório de algum renomado arquiteto. Alguém que tinha a admiração de Niemeyer. Alguém com quem ele iria mudar a história do Brasil.

sábado, 1 de março de 2008

PELADA

O primeiro lance é um passe para o lado, no campo de defesa. Você não joga há quase um ano e é melhor não arriscar. O passe sai certo, mas não demora muito para os momentos ridículos começarem a aparecer. Um pique destrambelhado e a bola não é alcançada; um domínio errado e ela sai pela lateral; um chute pífio e vai na direção do escanteio, bem devagar; um lançamento completamente desproporcional e a bola quase vai parar no segundo andar da quadra.

Até que vem o primeiro gol, de direita! Bom começo, mas só porque o goleiro não era goleiro de verdade e a bola sobrou ali, na pequena área, com o gol escancarado. A essa altura a dor ao lado da barriga tá gritando, o fôlego tá curto e o joelho esquerdo já dá sinal de alerta. Ainda rola uma boa jogada, costurando pelo meio (porque o outro time também tá meio cansado) e deixando na cara do gol, mas o outro chuta pra fora.

Já o passe de calcanhar sai cheio de estilo, no vazio da defesa. Pena que não tem ninguém do time por ali. Seguem-se as tabelas frustradas, as enfiadas pra ninguém e alguns dribles levados, até que vem o segundo gol.

Você tá na esquerda do ataque, um pouco à frente do marcador, e ela vem reta, quase junto à linha lateral. O gol tá ali no meio, na diagonal, e a posição favorece a canhota, graças a Deus. Você deixa a bola passar, pára ela com um toque do lado externo do pé esquerdo e, com o próprio, solta o chute, de três dedos.

Tá certo que só deu pra fazer isso tudo porque o marcador não é lá essas coisas e já tá morto, mas a bola sai rodando, cruzada, rápida, e morre no ângulo, lá do outro lado. Pronto, a pelada já cumpriu sua função.

Depois voltam os erros patéticos. Com o talento que Deus lhe deu, você erra mais passes que o Léo Lima, marca como o Júlio Santos e finaliza como o Jean. Mas tudo bem. O segundo gol já tá guardado na memória.

A matéria abaixo foi apurada toda por telefone, com base numa foto apenas, de um sujeito completamente pelado, andando acelerado como numa maratona de marcha atlética, pelo acostamento da maior ponte do país em seu lugar mais alto. "Escreve uma matéria disso aí", disse o chefe de reportagem jogando a foto ao lado da Remington das mais antigas, sobre uma das quatro mesas de tia da escola primária que formava um dos três "mesões" da redação onde do alto, no mezanino, Seu Remilton arrastava suas sandálias franciscanas, com a meia cinza, e sorvia a água de seu copo de geleia embaçado, etiquetado, enquanto cuidava, ao lado do bravo Tico, do embaralhado arquivo fotográfico aonde foi parar a imagem que pode ser, quem sabe, o registro da aparição de um desses sujeitos surgidos do nada como nos filmes, vindos de outro mundo ou de outra época. Por que não?

Jornal O Fluminense, edição de sábado, 7 de janeiro de 1995

A Polícia Rodoviária Federal informou que ele tinha sido capturado pelos soldados do Corpo de Bombeiros, mas no quartel da corporação em Niterói ninguém tinha notícias do maluco misterioso. O nudista da Ponte é moreno, com cabelos e barba pretos, e aparenta cerca de 35 anos.

Dessa vez não foram o excesso de veículos, a imprudência dos motoristas ou a falta de condições de alguns carros que provocaram acidentes e o conseqüente engarrafamento na Ponte Rio-Niterói. Já sobrecarregada com todos os problemas rotineiros, a Polícia Rodoviária Federal teve trabalho, na manhã de ontem, com uma das situações mais pitorescas da história da maior ponte do Brasil. Um homem, completamente nu, apareceu na altura do vão central e acabou provocando um acidente. O carro de bombeiros chamado para recolher o homem parou para pegá-lo e chocou-se com uma Brasília, que não conseguiu frear a tempo.
O acidente ocorreu por volta das 6h30min e gerou um congestionamento que se estendeu até a praça do pedágio. Ninguém soube informar de onde surgiu o louco despudorado nem para onde ele foi. A Polícia Rodoviária Federal informou que ele tinha sido capturado pelos soldados do Corpo de Bombeiros, mas no quartel da corporação em Niterói ninguém tinha notícias do maluco misterioso. O nudista da Ponte é moreno, com cabelos e barba pretos, e aparenta cerca de 35 anos.
O carro dos bombeiros mobilizado para recolher o homem nu foi uma Caravan, que foi atingida por trás pela Brasília marrom, placa LA-1158. Dois ocupantes da Brasília ficaram levemente feridos e foram levados para o Hospital Universitário Antônio Pedro (Huap). Cleuza Maria Gomes, 39 anos, e Gisele, 12, receberam alta ainda ontem. O trânsito ficou lento durante toda a manhã e o engarrafamento provocou retenções nas ruas Jansen de Mello, Feliciano Sodré e na Alameda São Boaventura, no Fonseca.