sexta-feira, 27 de janeiro de 2017

HELENINHA


Este blog está perto de fim. Será dado como encerrado no próximo dia 15 de abril, quando completará, exatos, dez anos. A ideia é que ele continue a existir como uma obra fechada, uma espécie de currículo virtual, mas com registros somente da produção impressa deste discreto repórter, também editor. Até o fim serão mais quatro textos, um em cada mês, dois em abril, além deste que não poderia ficar de fora do Relatos, muito mais pelo gabarito da personagem do que por qualquer mérito jornalístico da matéria aí embaixo.

Revista Istoé Gente, edição 282, de 10 de janeiro de 2005

“Comecei a ficar triste quando cheguei em casa. Me deu uma depressão, um vazio dentro de mim. A Nazaré me pegou”.

Sempre que foi questionada sobre o papel de maior repercussão ao longo de seus 37 anos de carreira, Renata Sorrah respondeu de imediato: Heleninha Roitman, a alcoólatra da novela Vale Tudo (1988) que até hoje é lembrada por fãs da atriz. Nos últimos meses, a convicção que sobreviveu a trabalhos memoráveis, como a destemida Pilar Batista de Pedra sobre Pedra (1992) e a cafetina Zenilda de A Indomada (1997), virou dúvida. Culpa da Nazaré de Senhora do Destino. Em sua primeira vilã na televisão, a atriz de 57 anos é a grande razão para assistir à novela que, com média de 58 pontos no Ibope, é a trama das oito de maior audiência desde O Rei do Gado, de 1996. A personagem fez sua intérprete mudar uma resposta que havia 16 anos era a mesma. “A Nazaré hoje está batendo com a Heleninha em popularidade, e acho que é capaz de passar”, afirma a atriz.
No fim de novembro, Renata teve uma prova do quanto a ex-prostituta que roubou a filha de outra mulher, matou o marido e assassinou uma antiga colega tem mexido com ela. Até então, a atriz nunca sentira qualquer carga emocional depois do trabalho. Chegava em casa e relaxava, por mais forte que tivesse sido a cena. Foi assim, por exemplo, quando fez no teatro, também em 2004, Medéia, que mata os próprios filhos. Mas, depois de gravar o diálogo em que sua personagem conta para Isabel, vivida por Carolina Dieckmann, que ela não era sua filha, a situação foi diferente. “Comecei a ficar triste quando cheguei em casa. Me deu uma depressão, um vazio dentro de mim. A Nazaré me pegou”, conta.
A personagem também modificou a rotina da atriz. Desde que começou a gravar Senhora do Destino, Renata nunca mais conseguiu andar diariamente ou fazer ginástica cinco vezes por semana. Quando tem uma brecha no horário, dá um rápido mergulho na piscina de sua casa, no Jardim Botânico, zona sul do Rio, ou tenta fazer exercícios, também em casa. A maior parte de seu tempo livre, porém, é dedicada aos estudos. Nos dias em que não grava, ela tira três horas da manhã e outras três da tarde para decorar textos e analisar as cenas seguintes. À noite, volta a estudar por uma hora antes de dormir. “Há muito tempo não me lembro de me envolver tanto numa novela”, diz a atriz. O resultado da dedicação é atestado pelo diretor da trama. “Conseguir empatia com o público interpretando uma vilã é coisa rara. Tenho certeza de que a Nazaré não seria esse sucesso todo se caísse em mãos mais convencionais do que as de Renata”, analisa Wolf Maya.
Em meio a tanto esforço, Renata Leonardo Pereira Sochaczewiski (o sobrenome é polonês) só não abre mão de um cinema, um teatro, ou uma saída com a filha, Mariana, 23, para espairecer. Também faz massagens de vez em quando, tudo para manter o equilíbrio emocional. “Tenho que ter força física e mental para agüentar até o fim da novela”, diz ela. Outro truque é nem sequer pensar em Vilma Martins, a mulher que está presa desde o ano passado por ter seqüestrado, em 1986, o menino Pedro Rosalino Braule Pinto, que acabara de nascer numa maternidade de Brasília. “Acompanhei a história na época e fiquei revoltada. Hoje procuro não pensar um minuto nessa pessoa. Não vejo entrevista, não penso nela, nada. Não é um astral que me ajuda”, explica.
O que tem auxiliado a atriz são as conversas freqüentes com as colegas de seu núcleo na novela, formado por Carolina Dieckmann, Leandra Leal e Malu Valle, além de Flávio Migliaccio e Thiago Fragoso. “Em novela, é importante a pessoa com quem você vai contracenar. Se não houver entrosamento, são nove meses de sofrimento. Não conhecia a Renata, mas estava a fim de trabalhar com ela. Achava que seria legal, e foi”, conta Leandra. A relação com Carolina também é boa e inclui telefonemas freqüentes entre as duas, sempre com comentários sobre a novela ou sugestões para melhorar a atuação de ambas. “A Carolina é muito inteligente, tem uma perspicácia de atriz, sabe detectar o que é preciso para melhorar as cenas”, diz.
Com Suzana Vieira, sua antagonista na trama, a atriz garante que também tem uma ótima relação, apesar de terem surgido notícias dando conta de que as duas estrelas da novela de Aguinaldo Silva têm se desentendido. “Não sei se, porque as personagens são inimigas, ficaram achando que nós também somos, mas não existe nada. Eu e Suzana trabalhamos juntas, somos companheiras. Ela é uma pessoa generosa, amiga e segura”, afirma Renata.
Além da Nazaré de Senhora do Destino, Renata brilhou nos palcos em 2004. Foi sucesso de público e crítica ao encenar no Rio Medéia, tragédia grega de Eurípides que, inclusive, a ajudou a compor a vilã da novela das oito. “Se estou fazendo legal a Nazaré, é porque vim toda preparada da Medéia”, afirma.
Se o ano foi bom profissionalmente, no restante também foi ótimo, por um motivo muito simples: a atriz não separa vida pessoal e profissional. Para ela, é tudo a mesma coisa. “O trabalho faz parte da minha vida de maneira tão intensa que tudo fica interligado”, afirma. Depois de três casamentos, com os atores Carlos Vereza e Marcos Paulo, pai de Mariana, e com o autor Euclydes Marinho, Renata está solteira. E sem sentir necessidade de um casamento. “Claro que tenho uns afetos, meus amores e tudo, mas, de ficar junto assim, casada, não estou sentindo falta. Às vezes você está casada e não está feliz. Eu estou feliz, todos os setores estão preenchidos”, diz. Para recarregar as baterias e agradecer o bom ano que passou, Renata comemorou o Réveillon no litoral alagoano. “Precisava mergulhar na água salgada para me revigorar”, afirma a atriz, que, em 2005, pretende levar Medéia para São Paulo e ainda montar Álbum de Família, de Nelson Rodrigues.