segunda-feira, 10 de abril de 2017

ALTA COSTURA

Ele já tinha conhecido a glória em seu ofício e, no entender do repórter leigo no assunto, não estava mais tão no topo nem da cadeia nacional quando concedeu a entrevista. Mas chegava de volta ao país natal com pompa e circunstância, após mais de quinze anos morando em Paris, no centro do mundo. Abria logo de cara seis lojas banhadas em luxo, e a entrevista, interrompida mais de uma vez para cenas de Jacques Leclair, ou Victor Valentim, foi na única delas no Rio, no coração de Ipanema, que em menos de um ano estaria fechada.

Revista Istoé Gente, edição 274, de 8 de novembro de 2004

“Não posso falar porque não conheço. Fico fechado no meu mundo”.

No fim de 2001, o estilista Ocimar Versolato, 43 anos, enfrentava problemas financeiros em Paris, chegou a pesar 104 kg e sofreu uma crise de pânico – tinha a impressão de que faltava ar em qualquer lugar que estivesse. Decidiu fazer análise pela primeira vez na vida, mas achou péssimo o analista francês que procurou. Numa viagem ao Brasil, aceitou o conselho de uma amiga e se consultou com um psicólogo brasileiro. Gostou.
Bem de cabeça, emagreceu 30 quilos com dieta nos últimos três anos. Só precisou de uma lipoaspiração antes de iniciar o regime, “para criar coragem”. Aumentou as vindas ao Brasil e, quando percebeu, já morava na terra natal de novo, numa casa no Morumbi, em São Paulo. Deixou para trás uma trajetória de 16 anos em Paris, onde conheceu a glória e o fracasso financeiro traduzido em dívidas. Só à previdência social francesa, devia cerca de US$ 300 mil.
Agora, Versolato acaba de inaugurar sua loja em Ipanema, no Rio de Janeiro, onde uma calça jeans custa R$ 450, o vestido de noite mais caro sai por R$ 28 mil e o preço de um terno é R$ 4,9 mil. Com cinco andares, elevador panorâmico e paredes de mármore, ela é a maior das outras seis da marca abertas no País (cinco em São Paulo e outra no Rio), graças ao investimento de R$ 15 milhões de sua nova sócia, Sandra Habib, representante da Jaguar no Brasil. Os modelos de alta-costura (US$ 10 mil o mais barato) serão exclusividade do ateliê do estilista, um prédio de nove andares em São Paulo. Versolato está de volta ao Brasil, e ai de quem disser que isso é sinal de derrota. “Isso é coisa de caipira, de quem nunca viajou ou foi para Paris uma vez na vida com passagem de US$ 300”, dispara.
Seu único problema na Europa, ele garante, foi a dificuldade de produzir suas roupas, resultado da pouca oferta de fábricas de tecidos de luxo por lá. No Brasil, Versolato tem à disposição uma rede com 30 fornecedores. “O investimento é resultado de um estudo de dois anos e dará retorno a médio prazo”, afirma Sandra.
Na temporada francesa, a polêmica causada por suas declarações também não ajudou. Na mais famosa delas, dita após um desfile de Yves Saint-Laurent, Versolato sugeriu que o consagrado colega francês se aposentasse. Hoje, se arrepende. “Foi coisa de iniciante. Não tinha o direito de falar aquilo”, diz.
No auge de seu sucesso em Paris, o brasileiro chegou a mudar o roteiro de um filme de James Bond, ao ser convidado para vestir em 1997 a atriz Terry Hatcher, bondgirl de 007, o Amanhã Nunca Morre. Terry deveria morrer enforcada com o vestido, mas o tecido sempre rasgava na cena. Após fazer 10 modelos iguais, sem que o problema fosse resolvido, ele resolveu interferir. “Sugeri que dessem um tiro nela. Foi o que fizeram”, lembra.
Uma outra experiência no cinema mudou o estilo de Versolato. Conhecido por preferir as cores sóbrias, ele entregou a Cacá Diegues desenhos nada condizentes com a exuberância da Tieta vivida por Sônia Braga no filme do diretor. Convencido pelo cineasta, mudou os figurinos. “O Cacá me deu um tratamento de choque. Meu trabalho mudou depois do filme”, lembra o estilista, para surpresa do próprio Cacá. “Me lembro de ter falado com ele na época, mas não sabia que tinha sido tão sério”, brinca o cineasta.
Disposto a expandir suas lojas para Paris e Nova York em dois anos, Versolato espera colocar o Brasil no cenário da moda internacional. “Estava faltando um projeto desse porte. Acho que não tinha mais ninguém para fazer isso além de mim”, afirma o estilista, que não cita nenhum outro nome de destaque no País, nem de colegas que têm se destacado no Exterior, como Alexandre Hercovitch. “Não posso falar porque não conheço. Fico fechado no meu mundo”, justifica.