sábado, 1 de março de 2008

PELADA

O primeiro lance é um passe para o lado, no campo de defesa. Você não joga há quase um ano e é melhor não arriscar. O passe sai certo, mas não demora muito para os momentos ridículos começarem a aparecer. Um pique destrambelhado e a bola não é alcançada; um domínio errado e ela sai pela lateral; um chute pífio e vai na direção do escanteio, bem devagar; um lançamento completamente desproporcional e a bola quase vai parar no segundo andar da quadra.

Até que vem o primeiro gol, de direita! Bom começo, mas só porque o goleiro não era goleiro de verdade e a bola sobrou ali, na pequena área, com o gol escancarado. A essa altura a dor ao lado da barriga tá gritando, o fôlego tá curto e o joelho esquerdo já dá sinal de alerta. Ainda rola uma boa jogada, costurando pelo meio (porque o outro time também tá meio cansado) e deixando na cara do gol, mas o outro chuta pra fora.

Já o passe de calcanhar sai cheio de estilo, no vazio da defesa. Pena que não tem ninguém do time por ali. Seguem-se as tabelas frustradas, as enfiadas pra ninguém e alguns dribles levados, até que vem o segundo gol.

Você tá na esquerda do ataque, um pouco à frente do marcador, e ela vem reta, quase junto à linha lateral. O gol tá ali no meio, na diagonal, e a posição favorece a canhota, graças a Deus. Você deixa a bola passar, pára ela com um toque do lado externo do pé esquerdo e, com o próprio, solta o chute, de três dedos.

Tá certo que só deu pra fazer isso tudo porque o marcador não é lá essas coisas e já tá morto, mas a bola sai rodando, cruzada, rápida, e morre no ângulo, lá do outro lado. Pronto, a pelada já cumpriu sua função.

Depois voltam os erros patéticos. Com o talento que Deus lhe deu, você erra mais passes que o Léo Lima, marca como o Júlio Santos e finaliza como o Jean. Mas tudo bem. O segundo gol já tá guardado na memória.

A matéria abaixo foi apurada toda por telefone, com base numa foto apenas, de um sujeito completamente pelado, andando acelerado como numa maratona de marcha atlética, pelo acostamento da maior ponte do país em seu lugar mais alto. "Escreve uma matéria disso aí", disse o chefe de reportagem jogando a foto ao lado da Remington das mais antigas, sobre uma das quatro mesas de tia da escola primária que formava um dos três "mesões" da redação onde do alto, no mezanino, Seu Remilton arrastava suas sandálias franciscanas, com a meia cinza, e sorvia a água de seu copo de geleia embaçado, etiquetado, enquanto cuidava, ao lado do bravo Tico, do embaralhado arquivo fotográfico aonde foi parar a imagem que pode ser, quem sabe, o registro da aparição de um desses sujeitos surgidos do nada como nos filmes, vindos de outro mundo ou de outra época. Por que não?

Jornal O Fluminense, edição de sábado, 7 de janeiro de 1995

A Polícia Rodoviária Federal informou que ele tinha sido capturado pelos soldados do Corpo de Bombeiros, mas no quartel da corporação em Niterói ninguém tinha notícias do maluco misterioso. O nudista da Ponte é moreno, com cabelos e barba pretos, e aparenta cerca de 35 anos.

Dessa vez não foram o excesso de veículos, a imprudência dos motoristas ou a falta de condições de alguns carros que provocaram acidentes e o conseqüente engarrafamento na Ponte Rio-Niterói. Já sobrecarregada com todos os problemas rotineiros, a Polícia Rodoviária Federal teve trabalho, na manhã de ontem, com uma das situações mais pitorescas da história da maior ponte do Brasil. Um homem, completamente nu, apareceu na altura do vão central e acabou provocando um acidente. O carro de bombeiros chamado para recolher o homem parou para pegá-lo e chocou-se com uma Brasília, que não conseguiu frear a tempo.
O acidente ocorreu por volta das 6h30min e gerou um congestionamento que se estendeu até a praça do pedágio. Ninguém soube informar de onde surgiu o louco despudorado nem para onde ele foi. A Polícia Rodoviária Federal informou que ele tinha sido capturado pelos soldados do Corpo de Bombeiros, mas no quartel da corporação em Niterói ninguém tinha notícias do maluco misterioso. O nudista da Ponte é moreno, com cabelos e barba pretos, e aparenta cerca de 35 anos.
O carro dos bombeiros mobilizado para recolher o homem nu foi uma Caravan, que foi atingida por trás pela Brasília marrom, placa LA-1158. Dois ocupantes da Brasília ficaram levemente feridos e foram levados para o Hospital Universitário Antônio Pedro (Huap). Cleuza Maria Gomes, 39 anos, e Gisele, 12, receberam alta ainda ontem. O trânsito ficou lento durante toda a manhã e o engarrafamento provocou retenções nas ruas Jansen de Mello, Feliciano Sodré e na Alameda São Boaventura, no Fonseca.