
Depois de uma série dedicada ao velho esporte bretão, no embalo da Copa na África do Sul (em que perdemos de novo, dessa vez graças a uma falha bisonha do tal “melhor goleiro do mundo”), o Relatos pede licença – e desculpas – à multidão de leitores para desovar por aqui algumas matérias sobre essa gente estranha, que infesta as ruas das nossas cidades em fotografias de rostos sorridentes, ou sérios, altivos, com olho fixo no horizonte de novas conquistas, ainda que estas sejam apenas um salário de deputado e a possibilidade de nomear algumas dezenas de assessores.
Serão duas séries de reportagens dessa vez, entremeadas por mais uma imperdível aventura de Honório, o Gurgel. A primeira série será dedicada à política local, com matérias protagonizadas por alguns dos personagens que ajudaram a transformar nosso amado estado do Rio de Janeiro nisto que vemos hoje. Depois o foco será a política nacional, os últimos 16 anos, em que muita coisa melhorou e outro tanto continuou na mesma.

Jornal do Brasil, edição de domingo, 30 de março de 1997
“Meu lema será o mesmo de César Maia. Vamos governar na ordem e na lei”
Prestes a completar três meses de governo, o prefeito Luiz Paulo Conde começa a enfrentar problemas que pareciam extintos pela mão-de-ferro de César Maia. A volta gradual dos camelôs a Copacabana, o tumulto causado pelas vans e táxis no trânsito e a depredação de equipamentos do Rio Cidade são exemplos de que, pelo menos no início de sua administração, Conde tem dificuldades em conciliar seu estilo bonachão com o dia-a-dia agitado do Rio. Apesar de continuar bem distante do estilo César Maia, o prefeito se esforça para mostrar que as coisas não vão mudar muito no Rio nos próximos quatro anos. “Meu lema será o mesmo de César Maia. Vamos governar na ordem e na lei”, afirma.

O anunciado reforço da Guarda Municipal nunca foi tão necessário para a continuidade do governo César Maia. Afinal, nos últimos três meses o afrouxamento na repressão levou os camelôs de volta à Zona Sul e facilitou a ação de vândalos, que não se intimidaram em destruir equipamentos do recém-inaugurado projeto Rio Cidade.
Em Copacabana, os camelôs continuam longe das vias principais, como a Nossa Senhora de Copacabana e a Barata Ribeiro, mas voltaram a armar barracas em outras sem o menor constrangimento. As calçadas da Rua Bolívar, por exemplo, viraram ponto de concentração dos vendedores, que disputam espaço com os pedestres e os buracos da expansão da NET. “Eles estão retornando. Só espero que o bairro não volte a ser o que era”, diz o aposentado Adalberto de Castro, 62 anos.
Não são apenas moradores de Copacabana que temem pelo futuro do que consideram boas realizações da prefeitura. “Está havendo um choque. Tínhamos um governo cheio de obras e novidades e, agora, temos um totalmente paralisado”, critica a guia de turismo Adriana Páscoa, 27, moradora de São Conrado. O paisagista aposentado Alberto Attademo, 71 anos, critica a conservação do Rio Cidade. “Está faltando uma boa fiscalização para evitar a degradação do projeto”.

O trânsito, aliás, é mais um dos problemas enfrentados por Conde neste início de governo. Desde que assumiu, o prefeito se viu às voltas com a guerra das tarifas dos ônibus intermunicipais – os donos das empresas se recusaram a cobrar a tarifa única de R$ 0,55 nos limites do Rio, conforme estipula o decreto 15.578 da prefeitura –, com anúncios de reajuste nas passagens dos ônibus municipais e com a polêmica envolvendo as vans.
“Encomendamos um estudo à Coordenação dos Programas de Pós-Graduação em Engenharia (Coppe) da UFRJ e em 15 dias receberemos a proposta deles para reorganizar as linhas de ônibus. Quero discutir com os empresários e apresentar o melhor plano possível à população, dentro de seis meses”, conclui o prefeito.